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quarta-feira, 4 de maio de 2011

1º SALÃO DE ARTE CONTEMPORÂNEA DO CENTRO-OESTE

Edney Antunes-GO, Humberto Espíndola-MS e Adir Sodré-MT.

O 1º Salão de Arte Contemporânea do Centro-Oeste pretende realizar a cada dois anos uma amostragem da arte produzida na região. Sua função é minimizar a enorme lacuna que separa os processos culturais desenvolvidos no Centro-Oeste, e criar uma força institucional no campo artístico que permita conexão, articulação e diálogo entre as produções plásticas de Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Distrito Federal.

Luiz Mauro - GO, artista premiado.

O 1º Salão de Arte Contemporânea do Centro-Oeste nasceu da indagação: qual a cara ou quais as caras da arte contemporânea realizada no Centro-Oeste? Perguntas difíceis de serem respondidas, porque faltam elementos que permitam a visão da identidade desta produção. Entretanto, baseado nas minhas investigações dentro deste território, lanço como prerrogativa a questão da multiplicidade da produção no que se refere aos meios técnicos e materiais, ao uso de suportes e de linguagens e ao repertório poético desenvolvido pelos jovens produtores em cada uma das unidades da Região. No Distrito Federal, apesar dos muitos caminhos existentes, destacam-se tanto o recurso aos meios tecnológicos, como o vídeo, quanto o recurso às linguagens tradicionais do desenho e da pintura, sejam figurativa ou abstrata. Em Mato Grosso a linguagem dominante é a pintura que prossegue em criações de cores ensolaradas que citam a exuberância da natureza e da cultura local. Em Mato Grosso do Sul sem uma identidade tão marcada quanto no Mato Grosso, a produção busca estruturar seu campo de trabalho incorporando influências externas e buscando suportes e linguagens mais atuais.

Pitágoras Lopes - GO, artista premiado.

Em Goiás a pintura e o desenho convivem com outras técnicas de natureza experimental e as poéticas se voltam para o indivíduo e seus conflitos com o mundo. Enfim, são muitas as caras da produção contemporânea do Centro-Oeste brasileiro, o que torna complexa a leitura e a interpretação das obras sem a compreensão dos contextos históricos, sociais e econômicos em que foram produzidas estas especificidades artísticas.

João Angelini e André Valente - DF, artistas premiados.

Os 20 artistas selecionados e a radiografia do presente
O volume de 277 artistas inscritos no 1º Salão de Arte Contemporânea do Centro-Oeste, demonstra a necessidade de ações que visem prestigiar e subsidiar a produção artística da Região. Dentro deste conjunto destaca-se em número de propostas a categoria pintura seguida pela fotografia, e observa-se também que a linguagem videográfica anda sendo mais explorada, enquanto a categoria escultura tem pouquíssimos representantes. Os apontamentos do Salão fornecem elementos para a compreensão dos rumos tomados pela produção artística do Centro-Oeste no começo do Século XXI.

Anna Bheatriz - GO, artista premiada.

A Comissão de Seleção – formada por Cayo Honorato (SP), Daniela Labra (RJ), Gilmar Camilo GO), Marília Panitz (DF) e Rafael Maldonado (MS) – selecionou vinte artistas entre os inscritos na concorrência, corporificando um extrato revelador das questões e tendências investigadas pelos artistas contemporâneos, mostrando uma radiografia do presente por meio das obras dos jovens produtores do Centro-Oeste.

Comissão de Seleção: Rafael Maldonado-MS, Carlos Sena-Curador, Marília Panitz-DF, Cayo Honorato-SP, Daniela Labra-RJ e Gilmar Camilo-GO.

A Comissão de Premiação – formada por Aguinaldo Coelho (GO), Celso Fioravante (SP), Felipe Scovino (RJ) e Wagner Barja (DF) premiou quatro propostas entre as vinte selecionadas, contemplando os seguintes artistas: Pitágoras Lopes-GO, Luiz Mauro-GO, João Angelini e André Valente-DF e Anna Bheatriz-GO.

Comissão de premiação: Aguinaldo Coelho-GO, Celso Fioravante-SP, Carlos Sena-Curador, Wagner Barja-DF e Felipe Scovino-RJ.

Artistas homenageados

O formato do Salão é renovado com a apresentação de quatro artistas homenageados pela importância de suas trajetórias e de suas contribuições durante décadas de trabalho: Humberto Espíndola do Mato Grosso do Sul, Adir Sodré do Mato Grosso, Edney Antunes de Goiás e Elder Rocha do Distrito Federal. Estes artistas são escolhidos pela curadoria e premiados em reconhecimento ao valor de suas obras para a construção da História da Arte no Centro-Oeste brasileiro, e seus trabalhos passam a integrar o acervo do Centro Cultural UFG.


Humberto Espíndola - MS, artista homenageado.

Com sua poética da Bovinocultura, Humberto Espíndola foi o primeiro artista do Centro-Oeste a se destacar no cenário da arte contemporânea brasileira. Um dos fundadores da arte contemporânea na região, ele foi pioneiro no uso de novos suportes e na criação de instalações e de objetos. Nascido em Campo Grande, onde iniciou sua trajetória, formou-se em jornalismo em Londrina e depois residiu em Cuiabá, onde fez grandes contribuições para o circuito de arte local, como a criação do Museu de Arte e Cultura Popular da Universidade Federal do Mato Grosso. Depois retornou novamente a Campo Grande e veio a assumir a Secretaria Estadual de Cultura e também a Diretoria do Museu de Arte Contemporânea do Mato Grosso do Sul. Os papéis de artista, gestor e ativista cultural se mesclaram na trajetória de Humberto Espíndola.

Humberto Espíndola - MS, artista homenageado.

A obra de Espíndola premiada pelo salão é significativa e pertence a uma das fases mais importantes do artista; integra a série “Confinamentos” (1972), datada do ano que participou da Bienal de Veneza, na Itália, e da Bienal de Medelim, na Colômbia. O trabalho é um objeto elaborado com couro do boi marcado com sinais de propriedades, crachá de premiação e arame farpado soldado a uma moldura de ferro, é uma obra que traduz a extensão da pesquisa de Humberto Espíndola sobre a Bovinocultura. Para acompanhar esta obra, Espíndola doou ao CCUFG outra obra intitulada “O Banho da Ninfa”, datada de 1995, e que é sua última pintura executada com tinta a óleo. A pintura apresenta figuras antropozoomorficas e revela ligações com a mitologia e com o erotismo.

Adir Sodré - MT, artista homenageado.

Adir Sodré pertence à segunda geração de artistas formada em Cuiabá no final dos anos 70 por meio do trabalho desenvolvido dentro do Ateliê Livre da Fundação Cultural de Mato Grosso. Nascido em Rondonópolis, mas vivendo na capital matogrossense, o artista iniciou seus estudos de pintura aos 14 anos de idade, e chegou ao posto de significativo expoente da conhecida Geração 80 Brasileira. A obra de Adir Sodré rompeu a fronteira do Mato Grosso participando de importantes exposições coletivas e realizando mostras individuais em galerias no eixo Rio/São Paulo e fora do Brasil. A linguagem pessoal do trabalho de Sodré se destacou por fazer uma mescla entre aspectos das culturas regional, como a paisagem cheia de frutas exóticas, com personalidades da cultura brasileira como o museólogo Pietro Maria Bardi, e com personalidades da cena internacional como a cantora Nina Hagen e a transformista Divine. Adir se destacou ao realizar cruzamentos entre elementos provenientes das esferas plásticas erudita, popular e de massa, e por mostrar um erotismo fora do comum que domina todas as formas da natureza.

Obras de: Adir Sodré e Elder Rocha.

A obra de Adir Sodré premiada pelo Salão é uma pintura de grande formato intitulada “Duas Japas na Amazônia e o Pintor do Mato” (2008), e na qual o artista dispensa o uso de chassis para estruturar o plano, apresentando simplesmente o tecido preso à parede (um procedimento típico dos anos 80). Nesta pintura o espaço é ocupado pelo desenho repleto de detalhes e de ornamentos, pelo colorido iluminado da natureza exuberante; Sodré alia História da Arte e paisagem cabocla, fazendo referência às gravuras japonesas que foram tão influentes sobre o impressionismo, além de colocar seu auto-retrato na cena, flutuando como um anjo pintor.

Edney Antunes - GO, artista homenageado.

O artista goianiense Edney Antunes possui uma trajetória iniciada por volta de meados dos anos 80, e como os artistas goianos de sua geração formou-se fora das escolas de arte e dentro do processo do autodidatismo. Desde o início foi marcado pela inquietação que o levava a pesquisar suportes e linguagens para seu trabalho. Integrou o Grupo Pincel Atônico que foi pioneiro na utilização das técnicas de grafite para realizar obras expostas em galeria ou em intervenção na paisagem de Goiânia. Ao longo de décadas de trabalho Antunes investigou materiais orgânicos e industriais; passou da pintura ao objeto e à instalação; criou obras de conteúdo político ou de cunho social; apropriou-se de imagens da mídia e tratou de temas como problemas da infância, violência, religião, medo, marginalidade social, biotecnologia, etc; operou com estratégias de participação e interação do espectador para completar o sentido da obra. Edney Antunes com suas instalações conquistou premiações em salões realizados em Goiás e noutros Estados.

Obras de: Humberto Espíndola, Pitágoras Lopes e Edney Antunes.

A obra de Antunes premiada pelo Salão é a instalação “ Neo-ready-made Bio-tecnológico” (2000), mostrada primeiramente no VII Salão da Bahia (2000-01). Nesta obra o artista condensa questões que estavam sendo debatidas na época de sua produção, na passagem do Século XX ao XXI, tais como a manipulação genética, clonagem e alteração do corpo. Antunes cita o ready made de Marcel Duchamp, apropriando-se de fotografias retiradas de revistas para serem multiplicadas e exibidas em caixas de luz, ao lado de espelhos de camarins contornados de lâmpadas acesas, que convidam o espectador a se olhar e se colocar em situação semelhante a da ovelha Dolly e de Michael Jackson; a obra funciona como um aparelho que carimba o espectador e aciona visibilidades pela captação especular e pela luminosidade que emana de si mesma.

Elder Rocha - DF, artista homenageado.

Nascido em Goiânia, mas residindo em Brasília desde onze anos de idade, o pintor e desenhista Elder Rocha formou-se pela UnB e depois fez mestrado em Londres com bolsa do British Council. De retorno ao Brasil, tornou-se professor formador de novas gerações de artistas na UnB, e desde os anos 80 é um dos mais destacados artistas de Brasília. Suas pinturas oitentistas eram carregadas materialmente e exacerbavam a função do gesto no embate entre o corpo do artista e a pintura que se constituía, porém, mais recentemente ele vem realizando obras empregando imagens ready-mades, extraídas de antigas ilustrações e portadoras de nostalgia, para abordar a crise do olhar provocada pelo excesso de imagens na atualidade. Elder enfatiza a materialidade e a planaridade da tela deslocando-a da condição de simples suporte para a situação de apresentação do campo bidimensional em si, e dessa maneira atualiza o uso do suporte anteriormente tantas vezes colocado em crise.

Elder Rocha-DF.

A obra de Elder Rocha premiada pelo Salão é uma pintura intitulada “Justaposição Polar” (2008), e que foi exibida na exposição individual homônima realizada no Centro Cultural Banco do Brasil, Brasília (2009). A obra de esmerada fatura técnica é uma mistura de desenho e pintura, e representa um homem com faixas amarradas na cabeça e no queixo como se tratasse suas muitas dores, tendo os olhos adoentados, secretando pruridos, sangrando; é uma metáfora dos olhos que de tanto ver ficam cegos pela extrema exposição, situação da contemporaneidade que por estar mergulhada num universo visual ilimitado e em processo de multiplicação, acaba por não mais perceber o que os olhos tocam.

O salão e o acervo do CCUFG

Com o 1º Salão de Arte Contemporânea do Centro-Oeste obras de oito artistas (quatro homenageados e quatro premiados) passam a integrar o acervo do Centro Cultural UFG. São aquisições importantes para o acervo, pois introduzem na coleção peças de artistas ainda não representados, ou enriquecem a representação de artistas com outras obras no acervo. O formato dado ao Salão unindo artistas referenciais a artistas emergentes, enlaçando o conhecido e o porvir, visa demonstrar como a História da Arte é uma construção coletiva de artistas de diversas épocas que apostam no futuro e renovam as linguagens e os repertórios. O desafio de um acervo de arte contemporânea (como é a vocação do nosso) é acompanhar este processo de renovação, do qual o Salão é o próprio laboratório.

Carlos Sena Passos
Curador do 1º Salão de Arte Contemporânea do Centro-Oeste, Diretor do Centro Cultural UFG, Professor de História da Arte na Faculdade de Artes Visuais da UFG.

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